
Fugindo do ruído da Faria Lima, com foco em “empresas de donos”, a casa busca compradores além das fronteiras para companhias que vão do agronegócio a tecnologia. Este ano, já concluiu 26 fusões e aquisições e há um pipeline importante nas próximas semanas que fará a casa bater o desempenho de 2024, segundo Daniel Milanez, sócio fundador da IGC Partners. Atuando exclusivamente no ‘sell side’, ou ponta vendedora, e fugindo das operações óbvias, na prateleira de M&As concluídos em 2025 há transações de companhias de fertilizantes (Aqua do Brasil) vendida à espanhola SAS, e Fass Agro, negociada com empresas de Cingapura e Índia. Em software, participou da venda da Labsoft para a americana Confience. “Temos elevada especialização e focamos na assessoria de companhias familiares, de donos, transações nada óbvias”, comenta Milanez na entrevista ao Além do Capital. O executivo também deu detalhes do crescimento da área mais recente da IGC, de Capital Solutions, criada há dois anos. Acompanhe:
A IGC Partners há dois anos fez um movimento para além do M&A e criou uma área de dívida. O que levou a casa a estabelecer esta nova vertical?
Resposta: A nossa vida sempre foi trabalhar com o cliente em dois tipos de transação. Venda da companhia ou fazer um fundraising, levantar capital, só que via equity. Nos últimos anos, percebemos que o mercado brasileiro estava começando a ter um movimento cada vez maior de capital privado com os fundos de crédito como opção para as empresas. Passamos a ter as três possibilidades. Ou vende a companhia ou a gente pode levantar capital via equity ou via dívida. Alguns dos nossos clientes faziam a operação fora de casa e agora passam a fazer internamente.
A casa sempre atuou com foco no assessoramento de empresas familiares, de dono. Qual os desafios desta atuação?
Resposta: É um nicho em que a grande maioria dos nossos concorrentes não consegue atuar. Esse tipo de empresa normalmente não tem um nível de organização que muitos dos nossos concorrentes estão acostumados a lidar. Quando a gente começou a IGC este grupo de companhias tinha um nível de desorganização maior. Melhorou, mas ainda existe e não considero um demérito para o empresário. Ele está lá construindo um business, preocupado com o comercial, a produção, como gerir pessoas. E não em ser expert em finanças, em ter seus KPIs organizados. O grande mérito da IGC é entender que o empresário não tem esse tipo de informação. A gente compreende muito bem isso.
Quais as sinergias que você vê entre as as duas áreas da IGC, de dívida e de fusões e aquisições?
Resposta: Tem sim [sinergias] porque, às vezes, para uma empresa é melhor ela fazer dívida no primeiro momento para crescer e depois um M&A. Às vezes levantar recursos via dívida é muito mais inteligente do que levantar via equity em determinadas situações. Isto ocorre com relativa frequência. Entramos em dívida em 2023, é recente, e o desempenho é bom. A gente tem feito um esforço grande de conversar com as empresas, explicar as operações que existem no mercado de capitais, como funciona uma operação de CRI, um CRA, FIDC ou uma debênture. É um trabalho que leva tempo. Entendo que é um papel importante da IGC porque temos acesso, fazemos transações em empresas que não estão na Faria Lima, mas no Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Goiás. São mercados com muito potencial. Se em 2026 tivemos uma Selic, um juro menor, esse tipo de operação ganha uma atratividade ainda maior.
No universo de companhias que vocês atuam, que tipo de instrumentos de dívida têm sido mais demandados?
Resposta: Depende muito do setor. Se é um cliente que, por algum motivo, tem ativos imobiliários provavelmente faça sentido ter alguma estrutura de CRI, no agro com CRA etc. Agora, se ele tem um viés mais de financiar seu cliente, fornecedor, provavelmente o FIDC faça sentido. A gente sempre tenta se colocar no lugar do empresário, do que é melhor para ele. A gente não é vendedor de produto. Nós atendemos a necessidade do cliente. Em M&A, por exemplo, só atuamos no sell side, o que é importante para evitar conflito de interesse. Claro que a gente está abrindo mão de vários negócios, mas faz sentido não atuar no buy side.
Qual o perfil das casas que vocês atendem, é do Middle Market?
Resposta: Nosso cliente tipicamente sempre foi uma empresa familiar, empresa de dono. O que o mercado chama de Middle? Eu mesmo não sei, cada um tem seu critério. Sobre tamanho das operações a gente já fez várias transações de bilhão, algumas em anos recentes que foram desse tamanho. Agora, a gente não assessora uma Petrobras, este tipo de companhia. Porque não é onde a IGC pode agregar muito. Agora para empresários, para famílias que têm negócios maravilhosos e que por uma série de motivos não são bem assessorados, nosso trabalho faz sentido.
As transações de M&A têm se recuperado, após um período de baixa, mas ainda abaixo do melhor momento do setor. A que você atribui este menor vigor e como tem sido o desempenho na IGC ?
Resposta: Muitas negociações maiores, via private equity, que dependiam de IPO para a saída de fato caíram. Acabou diminuindo o volume de M&A em geral no mercado, mas na IGC não houve redução. Isto pelo tipo de investidor que a gente busca. O público da Faria Lima é outro. Trabalhamos com empresa de dono. Temos muita especialização no agro, em consumo, varejo, saúde, indústrias e em tecnologia, software etc. Da ponta compradora temos conseguido negócios com empresas dos Estados Unidos, Canadá, Europa e Ásia. O cenário atual, de juro alto, atrapalhou um grupo específico de compradores. Tem três tipos de comprador. Um é o nacional, que sumiu em cenário de juro alto. Quem dependia deste parou, fez pouca coisa. O outro é o estrangeiro, que já está no Brasil ou na América Latina e foi um pouco afetado. E tem o gringo que não está no Brasil e o nosso trabalho, obviamente, é prospectar este grupo, que não foi afetado pelo juro alto. Ele não compra Brasil porque ninguém leva o deal para ele. É onde atuamos forte.
Quais as oportunidades este público comprador, que ainda não investiu no Brasil, têm prospectado?
Resposta: Eu vou te dar um exemplo. No agro, a gente fez muita coisa nos últimos cinco anos. Foram quase 50 transações, várias delas com compradores estrangeiros. Teve uma transação recente que a gente fez de uma empresa de fertilizantes, que foi para um comprador espanhol. A maior parte dos negócios dos últimos dois anos foi fechada mais com investidores europeus do que com americanos. Outra transação recente também com um player indiano. Não são os compradores, vamos dizer assim, mais conhecidos. A gente junta essa empresa familiar, de dono que, de novo, que não está muito no radar da turma da Faria Lima, com um tipo de comprador que também não está no radar. A gente tem feito transações importantes no nicho de serviços de tecnologia. O Brasil está virando uma nova Índia. Temos feito uma série de transações nesse espaço de IT Service, também tanto com players europeus, players americanos etc.
E destes setores que você citou onde estão as operações de maior valuation e em quais têm maior potencial daqui em diante?
Resposta: Em software, a gente tem feito uma série de transações com múltiplos valuations altíssimos, que são totalmente fora da realidade do Brasil. Se você pegar quanto vale as empresas de software brasileiras na Bolsa, a gente está vendendo por múltiplos que são literalmente o dobro. Isto porque achamos o comprador certo. É isso que faz a diferença. A grande maioria dos assessores vai atrás dos mesmos. Sobre perspectiva ou potencial é difícil falar em dois ou três setores. O que eu posso falar é que, por exemplo, o agro teve um momento muito bom há dois ou três anos, depois caiu bem e agora deve retomar a força. Porque são ciclos. Se olharmos para manufatura, indústrias, tem muito movimento ligado a data centers que está começando. Tem movimentação em todos os setores, praticamente, que eu mencionei.
Você citou valuations altos em softwares, especificamente, mas no geral os múltiplos têm caído nos últimos dois anos. É efeito apenas do juro alto?
Resposta: É um ótimo ponto. O juro alto afeta mais dois tipos de comprador, como eu disse, o nacional e o estrangeiro, mas que já tem presença aqui porém um pouco menos. Nos últimos quatro, cinco anos, 80% das empresas que vendemos foi para o comprador estrangeiro. A hora em que o juro retomar patamares menores no Brasil, a gente vai ter o comprador nacional voltando a competir. Hoje o comprador nacional, na grande maioria dos casos que a gente assessora, não consegue competir. Isto falando em M&A. Na área de Capital Solutions, se a queda da Selic se materializar em 2026 teremos mais empresas interessadas em captar via dívida. O juro alto afastou muitas companhias tanto das dívidas bancárias quanto do mercado de capitais, juro menor vai ajudar.
Este ano, como caminha o desempenho das áreas de Capital Solutions e de M&As. Como tem sido em números o desempenho?
Resposta: Na área de dívida, este ano a gente anunciou cinco transações e acho que foram transações, na média, entre R$ 100 milhões e R$ 150 milhões. A gente, como empresário, sempre acha que pode ser mais. Mas eu diria que está dentro do esperado. Nossa principal área segue sendo M&A que já fechamos 26 transações em 2025. Lembrando que M&A tem uma sazonalidade que favorece o final do ano. Vamos concluir novas operações na reta final do ano terminando acima do que foi 2024, quando foram 26 M&As. Temos no pipeline desta reta final várias operações e podemos fechar o ano com 40 transações.
Quando você olha para o futuro, quais são as novas frentes de atuação da casa? Crescimento seguirá orgânico ou tem espaço para aquisições?
Resposta: Se você for pensar, três, quatro anos atrás, a gente tinha quatro, cinco especializações na IGC. Hoje são mais de dez. As especializações tendem a acontecer cada vez mais. Claro que quando você começa a se especializar, fica com um pouco de medo, avalia se tem tantos negócios para fazer naquele nicho e tal. A partir daí é aquele trabalho de conhecer quem são os compradores desse nicho. A especialização, com certeza, é nossa aposta, onde a gente vai continuar crescendo, não tenho dúvida nenhuma. É onde os concorrentes não agregam. Saber que tem um indiano querendo entrar na América Latina, ou aquele belga, holandês. É uma informação que só a gente tem. Sobre crescimento inorgânico, eu, Daniel, sempre fui contra. Primeiro porque temos uma cultura muito forte. Somos mais de 30 sócios e 80% entraram como estagiários ou entraram recém-formados. Se você compra alguém com uma cultura muito diferente é ruim.
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